domingo, 22 de abril de 2012

Holanda: e a crise continua

Em post anterior referimos a (surpreendente) crise a emergir na Holanda, um dos pilares da política de austeridade e de intolerancia com os deficits dos países da Europa do Sul.
Os últimos desenvolvimentos vão no sentido previsto (ver artigos no WSJ: aqui e aqui): crise governamental por causa das políticas de controlo do deficit, eleições a caminho, reforço da extrema direita, crescendo das franjas anti-euro, ... 
  • The Netherlands has been a key ally of Germany and one of the most vociferous supporters of austerity since Greece's debt problems initiated the euro zone's debt crisis more than two years ago. But its economy is performing poorly and is expected to shrink this year, widening its budget deficit and making it one of the worst-performing in the euro zone.
Entretanto o AAA está também a caminho de desaparecer - e entretanto, se isso acontecer, na zona euro ficam apenas três países ainda com essa notação (Alemanha, Luxemburgo, Finlandia), o que não pode deixar de afetar o próprio euro.
O caso holandês é especialmente interessante porque mostra a instabilidade do sistema na eurozona  e como fácil e rápidamente as situações se podem inverter.
Tal como a Espanha, a Holanda também foi um país "bem comportado" (sobre a Espanha, ver posts anteriores, aqui e aqui). Sob o ponto de vista de endividamento, tem estado melhor do que a própria Alemanha, embora pior do que a Espanha (figura: government consolidated gross debt, % GDP):

Cenário semelhante quanto a deficits / superavits (figura: general government, net lending (+)/net borrowing (-) under the EDP (Excessive Deficit Procedure)) - até 2007 o deficit holandês foi quase sempre inferior ao deficit alemão (mas pior do que a Espanha a partir de 2000):


Apesar das taxas de juro do financiamento da divida público estarem a subir, continuam ainda longe de níveis preocupantes (ainda abaixo de 3%). Mas é muito sintomática como num ápice o deficit público subiu para níveis acima dos tais 3%, despoletando medidas restritivas para poder cumprir o normativo comunitário, na sequência de uma crise imobiliária associada a uma quebra da casa dos 10% (só!) no valor do imobiliário. 
E assim, de repente, os defensores da austeridade na casa dos outros, aparecem agora a lamentar a necessidade de políticas restritivas porque ... afectam negativamente o crescimento, e parecem não ter apoio da opinião pública. Mais desemprego por causa do limite do deficit, numa economia que pode perfeitamente funcionar durante algum tempo com algum deficit acima dos 3%. parece ser coisa difícil de engolir pelo eleitorado holandês. Pelo menos por uma parte deste começa a dizer que então é preferível sair do euro, e mesmo da UE, e voltar à antiga moeda.
Que isto esteja a acontecer no nucleo duro do euro é muito significativo, ao mesmo tempo que em França uma candidata presidencial anti-euro (e pró retorno ao franco) chega aos 20%. Como comenta um analista americano:
  • Core Europe has been worried for some time that an election in a peripheral country would produce a result that was anti-Euro. However the latest developments show strength for anti-Euro candidates in core countries.
(Dados: Eurostat).

(Atualizações: no WSJ e no Guardian, 24 abril. No excelente artigo do Guardian, Robin Wells comenta que:
  • But given that the sober Dutch are in no danger of defaulting on their AAA-rated bonds, why the turmoil and panic? Because, perhaps, the Dutch are indeed sober – and a significant number of them have said "enough". Having seen the devastation inflicted on the Greek, Irish and Spanish economies by tough austerity measures, many have concluded that the pain is simply not worth it to meet an arbitrary 3% deficit rule.
Num post do Projecto Syndicate (France and Frankfurt), Harold James, professor da U. Princeton, fala do origem da regra dos 3%:
  • The 3%-of-GDP cap on budget deficit, established somewhat arbitrarily in the 1990’s, also originated from the traumas of the Mitterrand experiment. Three percent of GDP was the figure that Delors calculated as the maximum deficit compatible with monetary stability in the circumstances of 1983. It then simply hardened into a general European rule in the 1990’s. Financial markets nowadays are much more aggressive than they were in 1981. There is no possibility of a two-year period of experimentation. The result will be very intense pressure for a rapid redesign of European institutions, with the risk that the outcome will lack credibility. )

Sem comentários: