quarta-feira, 28 de maio de 2014

E depois das eleições ... um novo xadrez político?

A minha análise dos resultados das ultimas eleições (*), porventura pouco convergente com o que muitos analistas têm dito:
1. O voto de protesto poderá ter sido da ordem dos 20%: crescimento do PS e da CDU, MPT, crescimento de brancos e nulos, e mesmo de outros pequenos partidos, perda de votos da coligação no poder.  Admito que estamos perante um novo xadrêz politico que poderá ser irreversivel - e por isso o quadro conceptual de análise terá que ser diferente.
2. A abstençao terá sido menor do que o costume, mas isso foi escondido pelo aumento da abstenção dita "técnica", que estará entre os 10 e 15%, pelo menos, dos eleitores registados, agravada pela saida de perto de 3% da população (emigração) nos ultimos anos. Como seria de esperar, a redução da abstenção foi canalizada para o voto de protesto.
3. Boas noticias: as hipóteses de governabilidade parecem ter melhorarado. Não é isso que muitos dizem, mas é o que me parece razoavel inferir. Talvez a coisa esteja algo empatada, segundo os resultados destas ultimas eleições, como diz Marcelo - assumindo com isso que ele é que poderia ser a "silver bullet" presidencial que poderia desempatar.  Com base nestes resultados, se estas eleições tivessen sido legislativas (ver aqui) não seria possivel constituir maiorias sólidas. Mas isso ignora que estes resultados abriram as portas a novas soluções que é razoavel antecipar como muito possiveis nas próximas legislativas. Na dinamica de novas eleições legislativas, uma parte dos votos de protesto deverão voltar ao PS - mesmo que o MPT consiga converter-se num movimento politico consistente, o que não é de excluir e é mesmo muito possivel que aconteça.
4. Ao contrário daquilo que o BE e o PC sempre fizeram, nem o MPT nem o Livre parecem ter por vocação o "orgulhosamente sós" que tem caraterizado o comportamento politico do PC e do BE. O facto dos votos do MPT e do Livre não serem neste momento suficientes para uma coligação com maioria absoluta com o PS não significa que não o possam ser nas próximas eleições, até porque a diferença atual para tal é inesperada e surpreendentemente pequena. Visto assim, os resultados destas eleições parecem dizer que:
- o comportamento da direção do PS foi considerada inadequado e insuficiente como protesto reativo e como combate politico contra o governo da coligação e contra as politicas de austeridade sem reforma do estado e da economia
- mas o voto de protesto foi canalizado para novos veiculos partidários, nas franjas atuais do sistema politico e partidário, mas dentro dele, e que em principio sugerem expectativas positivas para a formação de consensos à esquerda. Essa será a grande novidade (finalmente?). Afinal os portugueses parecem sugerir que pretendem consensos partidários, mas dentro da linha de mudança da atitude europeia e da politica de austeridade, e pretendem que esses consensos que materializem nas zonas da esquerda democrática.
5. Tudo indica que o grande perdedor tem sido o CDS, que poderá estar agora reduzido a menos votantes do que o novo MPT, e até talvez mesmo não mais do que o novo Livre - pelo menos enquanto que coligado.
5. Por isso esta nova dinamica poderá vir a ser muito incomoda para o PC ou CDU: apesar de todos reconhecerem que é um dos vitoriosos destas eleições, neste novo cenário o isolacionismo sistemático poderá deixar de render as boas "rendas" que tem rendido de forma sistemática. Curiosa a posição de Jerónimo de Sousa, a reclamar de imediato um lugar em qualquer solução de esquerda, mesmo aceitando que afinal a CDU não a pode conseguir só por si.
5. E o futuro sem futuro do BE parece definido. A ideia que o regresso de Louçã para salvar o BE parece pouco credível - a menos que faça uma pirueta política e se abra a coligações de esquerda e a sujar as mãos na governação. Afinal foi o chumbo do PEC IV e do anterior governo, a aliança suicida do BE com a direita de Portas e Passos Coelho para o derrube de Socrates, que abriu as portas á troika e que acelerou a morte a prazo do BE. Os resultados do BE e do Livre em Lisboa são mesmo muito esclarecedores.
6. MPT e Livre foram as boas noticias destas eleições. Assim saibam sobreviver, para bem da democracia portuguesa. A história do PRD (lembram-se?) pode ser muito edificante e util de ensinamentos ... tanto para Marinho Pinto como para Rui Tavares.

(*) escrito antes de ser conhecida a candidatura de António Costa. A sua eventual liderança do poderá reforçar o "momentum" do PS e assim reduzir um pouco a importancia das novas forças políticas emergentes, mas acima de tudo criaria condições mais favoraveis para consensos á esquerda, envolvendo essas forças.

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